Ao Mestre Com Carinho


Aos admiradores do mestre da payada foi definida a data de 30 de Maio de 2009 para a inauguração do Monumento (feito em concreto armado com seis metros de altura, pesando doze toneladas) em homenagem ao Poeta e Payador Jayme Caetano Braun. Será num sábado, na semana de aniversário do município, a partir das 14h, em São Luiz Gonzaga.
É com alegria que escrevo sobre esta homenagem mais do que justa ao homem que retratou em prosas e versos a vida, os costumes, a alegria e a dor do povo gaúcho.
E aqui presto minha reverência ao mestre Jayme publicando uma de suas mais famosas obras:

Bochincho
Composição: Jayme Caetano Braum
A um bochincho - certa feita,
Fui chegando - de curioso,
Que o vicio - é que nem sarnoso,nunca pára - nem se ajeita.
Baile de gente direita Vi, de pronto, que não era,
Na noite de primavera Gaguejava a voz dum tango
E eu sou louco por fandango Que nem pinto por quirera.
Atei meu zaino - longito, Num galho de guamirim,
Desde guri fui assim, Não brinco nem facilito.
Em bruxas não acredito'Pero - que las hay, las hay',
Sou da costa do Uruguai, Meu velho pago querido
E por andar desprevenido Há tanto guri sem pai.
No rancho de santa-fé, De pau-a-pique barreado,
Num trancão de convidado Me entreverei no banzé.
Chinaredo à bola-pé, No ambiente fumacento, Um candieiro, bem no centro,
Num lusco-fusco de aurora, Pra quem chegava de fora
Pouco enxergava ali dentro!
Dei de mão numa tiangaça Que me cruzou no costado, E já sai entreverado
Entre a poeira e a fumaça, Oigalé china lindaça, Morena de toda a crina,
Dessas da venta brasina, Com cheiro de lechiguana
Que quando ergue uma pestana
Até a noite se ilumina.
Misto de diaba e de santa, Com ares de quem é dona E um gosto de temporona
Que traz água na garganta. Eu me grudei na percanta O mesmo que um carrapato
E o gaiteiro era um mulato Que até dormindo tocava
E a gaita choramingava Como namoro de gato!
A gaita velha gemia, Ás vezes quase parava, De repente se acordava
E num vanerão se perdia
E eu - a contra pele macia Daquele corpo moreno, Sentia o mundo pequeno,
Bombeando cheio de enlevo
Dois olhos - flores de trevo Com respingos de sereno!
Mas o que é bom se termina- Cumpriu-se o velho ditado,
Eu que dançava, embalado, Nos braços doces da china Escutei - de relancina,
Uma espécie de relincho, Era o dono do bochincho, Meio oitavado num canto,
Que me olhava - com espanto, Mais sério do que um capincho!
E foi ele que se veio, Pois era dele a pinguancha,
Bufando e abrindo cancha Como dono de rodeio.
Quis me partir pelo meio Num talonaço de adaga Que - se me pega - me estraga,
Chegou levantar um cisco, Mas não é a toa - chomisco! Que sou de São Luiz Gonzaga!
Meio na volta do braço Consegui tirar o talho E quase que me atrapalho
Porque havia pouco espaço, Mas senti o calor do aço E o calor do aço arde,
Me levantei - sem alarde, Por causa do desaforo E soltei meu marca touro
Num medonho buenas-tarde!
Tenho visto coisa feia, Tenho visto judiaria, Mas ainda hoje me arrepia
Lembrar aquela peleia, Talvez quem ouça - não creia,
Mas vi brotar no pescoço, Do índio do berro grosso
Como uma cinta vermelha E desde o beiço até a orelha Ficou relampeando o osso!
O índio era um índio touro, Mas até touro se ajoelha, Cortado do beiço a orelha
Amontoou-se como um couro E aquilo foi um estouro,
Daqueles que dava medo, Espantou-se o chinaredo
E amigos - foi uma zoada, Parecia até uma eguada Disparando num varzedo!
Não há quem pinte o retrato Dum bochincho - quando estoura,
Tinidos de adaga - espora E gritos de desacato.
Berros de quarenta e quatro De cada canto da sala
E a velha gaita baguala Num vanerão pacholento, Fazendo acompanhamento
Do turumbamba de bala! É china que se escabela, Redemoinhando na porta
E chiru da guampa torta Que vem direito à janela, Gritando - de toda guela,
Num berreiro alucinante, Índio que não se garante, Vendo sangue - se apavora
E se manda - campo fora, Levando tudo por diante!
Sou crente na divindade, Morro quando Deus quiser, Mas amigos - se eu disser,
Até periga a verdade, Naquela barbaridade, De chínaredo fugindo, De grito e bala zunindo,
O gaiteiro - alheio a tudo, Tocava um xote clinudo, Já quase meio dormindo!
E a coisa ia indo assim, Balanceei a situação,- Já quase sem munição,
Todos atirando em mim. Qual ia ser o meu fim, Me dei conta - de repente,
Não vou ficar pra semente, Mas gosto de andar no mundo,
Me esperavam na do fundo, Saí na Porta da frente...
E dali ganhei o mato, Abaixo de tiroteio E inda escutava o floreio Da cordeona do mulato
E, pra encurtar o relato, Me bandeei pra o outro lado, Cruzei o Uruguai, a nado,
Que o meu zaino era um capincho E a história desse bochincho Faz parte do meu passado!
E a china?? - essa pergunta me é feita A cada vez que declamo
É uma coisa que reclamo Porque não acho direita, Considero uma desfeita
Que compreender não consigo, Eu, no medonho perigo Duma situação brasina
Todos perguntam da china E ninguém se importa comigo!
E a china - eu nunca mais vi
No meu gauderiar andejo, Somente em sonhos a vejo Em bárbaro frenesi.
Talvez ande - por aí, No rodeio das alçadas, Ou - talvez - nas madrugadas,
Seja uma estrela chirua Dessas - que se banha nua No espelho das aguadas!
Abraços,
Rafa.

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